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Biocombustíveis levantam polêmica na Europa

Buscando reduzir as emissões de gases do efeito estufa em 20% até 2020, a União Europeia concordou que 10% dos combustíveis utilizados para transporte sejam provenientes de fontes renováveis. 

Diversos grupos vem há anos alertando que esta meta poderia causar mais mal do que bem ao abrir mercado para combustíveis que não assim tão "limpos". Agora, chegou o momento em que as discussões tomaram proporções oficiais.

Connie Hedegaard, comissária da União Europeia para o clima, alertou, em entrevista ao Euractiv, sobre a expansão do uso de biocombustíveis.


"É ótimo ver o potencial das novas tecnologias, mas devemos ter muito cuidado para não estabelecer um novo setor enorme e então, após algum tempo, dizer: isto não é bom". Atualmente, o uso de biocombustíveis na Europa responde por 4,7% da demanda total.

Ela argumenta que na época da elaboração da política do bloco em apoio aos biocombustíveis, o conhecimento e a ciência para tal ainda não estavam tão avançados e que agora é uma batalha conseguir determinar os fatores de impacto indiretos sobre o uso da terra.

Ao mesmo tempo, a Comissão Europeia está finalizando uma avaliação sobre os potenciais efeitos negativos dos combustíveis de plantas sobre o clima, e a publicação está programada para as próximas semanas.

O Euractiv teve acesso ao rascunho da avaliação, cuja conclusão indica que as emissões de biocombustíveis provenientes de fontes como óleo de palma, soja e colza podem superar as de combustíveis fósseis quando consideradas as mudanças indiretas no uso da terra, ou seja, o desmatamento em outras áreas para compensar as terras dedicadas para o plantio de biocombustíveis.

Para efeito de comparação, o petróleo retirado de areias betuminosas libera 107 gramas de CO2 equivalente por megajoule de combustível, o óleo de palma emite 105g, a soja 103g, o colza 95g e o girassol 86g, segundo os novos dados da União Europeia. O fator da cana-de-açúcar seria bem inferior, apenas 36g.

Impactos

De acordo com dois relatórios lançado nesta semana pelas ONGs Friends of the Earth (FOE) e ActionAid, a meta de 10% de renováveis nos transportes europeus adicionará entre € 94 bilhões e € 126  bilhões aos custos dos combustíveis até 2020.

"Consumidores e contribuintes estão pagando mais por esta política, que alcançará muito pouco e que acreditamos que cause degradação ao ambiente, além de fome e pobreza", comentou Robbie Blake, ativista da FOE Europa, em entrevista a Business Week.


A denúncia das ONGs é que mais de 37 milhões de hectares já foram grilados ao redor do globo para a produção de biocombustíveis, sendo que a África é a mais atingida, com 66% do total.

"A Europa deve eliminar sua metas e subsídios para os biocombustíveis, substituindo por mais políticas custo-efetivas, que realmente reduzem as emissões dos transportes e não destroem o meio ambiente", sugeriu Blake.

As ONGs defendem o aumento da eficiência dos automóveis, a redução do consumo de energia através da melhoria do transporte público e do uso de bicicletas e o aumento do uso de eletricidade "genuinamente" renovável.

Dois relatórios sobre a situação da fome no mundo (um deles da FAO) divulgados no início do mês de outubro de 2011, já apontavam a demanda de produção agrícola para o uso em biocombustíveis como um fator importante na instabilidade internacional dos preços de alimentos, que vem agravando a fome em áreas mais vulneráveis do mundo, como o Chifre da África, região que inclui países como Etiópia e Somália.


Soluções

Assim como na questão dos agrotóxicos, o diferencial para os produtores de biocombustíveis pode vir na forma de certificações que começam a surgir no horizonte mundial.

A União Europeia aprovou em julho de 2011 sete esquemas voluntários de certificação oferecidos para biocombustíveis. Após o enquadramento em um dos padrões, são certificados os biocombustíveis que emitam 35% a menos de gases do efeito estufa do que o petróleo, aumentando para 60% em 2018.

Entre eles estão as certificações ‘Bonsucro’ e ‘Greenergy’, focadas nos biocombustíveis de cana-de-açúcar do Brasil. Já o ‘RTRS EU RED’ abrange biocombustíveis de soja da Argentina e Brasil. Vários produtores brasileiros já estão trabalhando com as certificações visando demonstrar que seu combustível está cumprindo com os normas sociais e ambientais.

Em nosso país, o Inmetro está desenvolvendo o Programa Brasileiro para Certificação de Biocombustíveis baseado em critérios técnicos preestabelecidos, contemplando a qualidade intrínseca do produto e o impacto socioambiental do processo produtivo. 


Sob o Programa Nacional de Produção e Uso do Biodiesel (PNPB), o Ministério da Agricultura também concede o Selo Combustível Social, vinculando a venda do biodiesel no leilão da ANP à contrapartida de a indústria adquirir uma porcentagem mínima de sua matéria-prima na agricultura familiar.

O produtor de biodiesel que tem o selo se beneficia de algumas condições especiais. Dentre elas, diferenciação ou isenção nos tributos PIS/Pasep e Cofins, participação assegurada de 80% do biodiesel negociado nos leilões públicos da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), acesso às melhores condições de financiamento junto aos bancos que operam o Programa (ou outras instituições financeiras que possuam condições especiais de financiamento para projetos) e a possibilidade de uso do selo para promover a sua imagem no mercado.

No caso do biodiesel, segundo estimativas da Associação dos Produtores de Biodiesel do Brasil, nosso país fechou 2011 como o maior mercado consumidor deste combustível do mundo, passando a Alemanha.

O Brasil produziu e consumiu 2,8 bilhões de litros de biodiesel, 17% a mais do que em 2010. No país europeu, a estimativa de consumo passou de 2,4 bilhões de litros para 2,6 bilhões de litros, crescendo menos devido à crise em que se encontra o bloco europeu.

Com as perspectivas de crescimento da produção de bicombustíveis face às questões de segurança ambiental e energética, o surgimento de inovações tanto no campo comercial quanto tecnológico é elementar para o avanço de um setor que pode ser uma alternativa para uma economia mais limpa.

Autor: Fernanda B. Müller   -   Fonte: Instituto CarbonoBrasil/EuroActiv/Agências